terça-feira, 6 de julho de 2010

Socorram-me subi no ônibus em Marrocos

Ainda no avião da Air Maroc dava pra ter uma ideia do choque holanda-marrocos que iríamos viver durante a viagem: várias mulheres de véu, comida boa e uma estranha abordagem no jornal marroquino em francês. Nele tinha uma matéria de três páginas apoiando a implementação da educação sexual nas escolas marroquinas. Um nível de discussão que eu só imagino existir num Brasil de lá pelos anos 60.

Desembarcamos em Marrakesh depois de uma escala em Casablanca. A primeira lembrança que eu tenho, depois do lindo aeroporto é da bagunça do trânsito, da quantidade de bicicletas misturadas com motocicletas e com os carros. A segunda imagem mais marcante são as cores, ou melhor, a cor, tudo é terracota: as casas, as ruas, o pôr-do-sol, o deserto: é uma cor única e linda (pros meninos que não sabem a diferença entre roxo e lilás, terracota é aquela cor de telha, tipo um vermelho fubento). A cidade encanta de qualquer esquina que você olhe, aliás o país inteiro, são paisagens naturais, contrastes urbanos, luz intensa e calor gostoso.



A viagem inteira totalizou 7 dias, 2 cidades, algumas centenas de quilômetros percorridos, varias cidadezinhas e um pouco de deserto do Saara (Allah-lá-ô, ô ô ô ô ô ô). Miriam, nossa amiga marroquina, compara Marrakesh com Salvador. Ela é de Rabat, a Brasília marroquina, e como a gente, se sentiu viajando pelo Nordeste do Brasil - o que pra mim, depois de um ano em terras européias, foi como voltar pra casa. E como 'essa volta' me fez bem!


Marrocos é religião forte, é povo supersticioso, de bem com a vida, sorridente. Povo que também faz de tudo pra conseguir o ganha pão, que explora os turistas da mesma forma que em Salvador, que canta, que dança, que não tem pressa e quer agradar.



O maior ponto de diferença das nossas gentes é o mesmo que traz semelhanças incriveis: a religião. Sempre vem um graças a Deus (hamdu lillah) depois de um 'tudo bem?'; um se Deus quiser (inshallah) depois de uma afirmação positiva. Os mulçumanos tomam vários banhos ao dia, comem tudo bem doce e vira seu melhor amigo em 5 minutos. Mas a religião traz também grandes diferenças: ambos homens e mulheres usam roupas bem cobertas, independente da temperatura. As mulheres, principalmente, têm um comportamento reservado, comportamento esse que é interessantemente refletido na arquitetura, principalmente nas residências, que são completamentes voltadas para o seu interior.


Falando em arquitetura, teve uma coisa que me chamou muita atenção: as grades. Toda janelinha tinha uma danada de uma grade, não por segurança que é um dos lugares mais tranquilos que eu já fui, eu acho que é uma involução das antigas treliças de madeira (?)... talvez. Sendo que quem me conhece bem sabe que eu odeio grades. E continuo odiando. Mas as danadinhas lá, naquele contexto, eram essenciais pra paisagem. As casas às vezes nem eram bonitas, mas do jeito que elas estavam ali, com o contexto do entorno, me fez aceitá-las, com grade e tudo. E comecei a realizar que é injusto eu achar Mangabeira, Valentina ou o Cristo feios. Aquilo é tão único do Brasil, de uma certa classe social, que não é justo a gente querer que se pareçam com a orla de Cabo Branco. Porque o contexto do bairro e das casa dali é vida, são os gostos das pessoas que moram ali, o que eles acham certo e o que eles podem pagar. No final, esses bairros da zona sul são muito mais autênticos que um plágio barato (e talvez bonito) de Sandra Moura*.



No voo de volta, o mesmo jornal que a gente leu na ida tinha uma matéria extensiva sobre masturbação. Por incrível que pareça, apoiando completamente a prática. De toda forma eu voltei pra Holanda encantada, com gostinho de quero mais - fazendo planos pra voltar no fim do ano, feliz com meu aprendizado e com minha nova forma de ver o Brasil, e me perguntando 'o que muléstia de uma figa eu tou fazendo na Holanda?


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* Independente de estética, é claro que é preciso garantir que bairros e residências tenham conforto térmico, acústico e visual. Mas isso é uma conversa longa, talvez eu volte a isso por aqui um dia.

6 comentários:

  1. Adorei o texto, Aida. Deve ser confortante mesmo encontrar um pouco da gente num lugar, a princípio, tão diferente.
    Põe mais desse terracota aqui pra gente ver! :)

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  2. E já tá nos padrões da reforma ortográfica! :)
    Sério... o problema da Josefa Taveira vai além da estética, como vc bem mencionou. Se pudesse haver um meio termo... A mudança do trânsito já foi iniciada, com opiniões pós e contra. Mas espero vc comentar de novo aqui :)
    Abração procês!
    Oranje boven! hehehe

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  3. Ai que saudade das pessoas falando comigo, ficando amigas em 5 minutos, dentro de um ônibus ou no supermercado. Aqui o povo é frio, cinza, olham pra você com o mesmo entusiasmo com que olham pra uma parede branca...

    Adorei ouvir as histórias , Aida!
    Beijo
    p.s.: E quando quiser passear por aqui avise, vou adorar sua companhia!

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  4. Aida voltou...ebaaaa
    Ja estava com saudades...

    Querida, muito interessante o seu post, até por que a única experiência com mussulmano que eu tive foi com um turco que se enquadra bem nos 5 minutos que você descreveu, mas que depois de uns dias nao conseguiu esconder a superficialidade da sua entao cordialidade...rsrsrsrs

    No mais, tenho muita vontade de conhecer Marrocos, entao quem sabe no final do ano?????Tem lugar na sua mala???

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  5. Aidão,

    Você falou, falou, mas acabou sem esclarecer para nós, meninos, a diferença entre roxo e lilás!

    :P

    Beijos grandes

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  6. Oxídio, pensa assim: roxo é uma cor que Mortícia (Adams) usaria mais, já lilás tá mais pra cor da parede de quarto de bebê.

    :P

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